Dispõe sobre a necessidade de se conferir absoluta prioridade à imposição das medidas protetivas de urgência de apreensão de arma de fogo que esteja em poder do agressor e de suspensão da posse ou restrição do porte de armas.
O PRESIDENTE DO CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA, no uso de suas atribuições legais e regimentais,
CONSIDERANDO o poder normativo constitucionalmente deferido ao Conselho Nacional de Justiça (art. 103-B, § 4o, inciso I, da CF);
CONSIDERANDO que é dever do Estado criar mecanismos para coibir a violência doméstica (art. 226, § 8o, CF);
CONSIDERANDO que a eliminação da violência doméstica e familiar contra a mulher é condição indispensável para o seu desenvolvimento afetivo, psíquico, intelectual e laboral, bem como de seus filhos;
CONSIDERANDO o inaceitável aumento do número de feminicídios no Brasil, bem como das diversas modalidades de violência no ambiente doméstico e familiar;
CONSIDERANDO que a Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher ("Convenção de Belém do Pará"), promulgada pelo Decreto no 1.973/1996, determina aos Estados Partes que incorporem na sua legislação interna normas penais, processuais e administrativas para prevenir, punir e erradicar a violência contra a mulher, bem como que adotem as medidas administrativas e jurídicas necessárias para impedir que o agressor persiga, intimide, ameace ou coloque em perigo a vida ou integridade da mulher, ou danifique seus bens (art. 7o, ”c” e “d”);
CONSIDERANDO que a Recomendação Geral no 35 do Comitê para Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra a Mulher (CEDAW) orienta os Estados Partes a “adotar e implementar medidas efetivas para proteger e assistir mulheres autoras e testemunhas de denúncias relacionadas à violência de gênero, antes, durante e após o processo legal”, o que inclui o “fornecimento de mecanismos de proteção apropriados e acessíveis para prevenir a violência futura ou em potencial” (item 31, alínea “a.ii”);
CONSIDERANDO a necessidade de se desenvolverem políticas públicas que “visem garantir os direitos humanos das mulheres no âmbito das relações domésticas e familiares no sentido de resguardá-las de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão” (art. 3o, § 1o, da Lei no 11.340/2006);
CONSIDERANDO que, em todos os casos de violência doméstica e familiar contra a mulher, feito o registro da ocorrência, deverá a autoridade policial verificar se o agressor possui registro de porte ou posse de arma de fogo e, na hipótese de existência, juntar aos autos essa informação, bem como notificar a ocorrência à instituição responsável pela concessão do registro ou da emissão do porte (art. 12, VI-A, da Lei no 11.340/2006);
CONSIDERANDO que, usualmente, ao registro da ocorrência, não raras vezes, a vítima declara à autoridade competente ou no preenchimento do formulário nacional de avaliação de risco que o agressor possui arma de fogo sem registro de porte, em desacordo com determinação legal ou regulamentar, o que, além de agravar o risco a que está submetida, é crime tipificado pela legislação penal, a permitir a concessão da medida protetiva de urgência de apreensão e busca domiciliar e pessoal, em sede de tutela de urgência ( art. 18-A da Lei Maria da Penha e art. 240, §§ 1o e 2o, “d”, do Código de Processo Penal);
CONSIDERANDO que o(a) juiz(a), no prazo de 48 (quarenta e oito) horas do recebimento do pedido de medida protetiva de urgência, deverá determinar a apreensão imediata de arma de fogo sob a posse do agressor (art. 18, IV, da Lei no 11.340/2006);
CONSIDERANDO que, constatada a prática de violência doméstica e familiar contra a mulher, o(a) juiz(a) poderá aplicar ao agressor, de imediato, a medida protetiva de urgência de suspensão da posse ou restrição do porte de armas, com comunicação ao órgão competente (art. 22, I, da Lei no 11.340/2006);
CONSIDERANDO a necessidade de se conferir plena efetividade às medidas protetivas de urgência em questão, no intuito de se evitar a escalada e a intensificação da violência, e de se prevenirem feminicídios;
CONSIDERANDO a decisão proferida pelo Plenário do Conselho Nacional de Justiça no julgamento do Procedimento de Ato Normativo no 0007751-33.2021.2.00.0000, na 340ª Sessão Ordinária, realizada em 19 de outubro de 2021;
RESOLVE:
Art. 1o Recomendar a todos os juízes e juízas que atuem em Varas do Júri e em Juizados e Varas e que detenham competência para aplicar a Lei no 11.340/2006, que confiram absoluta prioridade à determinação de:
I – apreensão imediata de arma de fogo sob a posse do agressor (art. 18, IV, da Lei no 11.340/2006), com busca domiciliar e pessoal, se necessário (art. 240, §§ 1o e 2o, “d”, do Código de Processo Penal);
II – aplicação imediata da medida protetiva de urgência de suspensão da posse ou restrição do porte de armas (art. 22, I, da Lei no 11.340/2006).
Art. 2o Para a consecução dos fins previstos no artigo anterior, os órgãos do Poder Judiciário deverão, preservadas a imparcialidade e a independência funcional do magistrado e da magistrada, promover a integração operacional com o Ministério Público e com as áreas de segurança pública, notadamente para garantir máxima celeridade ao cumprimento do disposto no art. 12, VI-A, da Lei no 11.340/2006.
Art. 3o Esta Recomendação entra em vigor na data de sua publicação.
Ministro LUIZ FUX