Identificação
Recomendação Nº 139 de 12/12/2022
Apelido
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Temas
Ementa

Recomenda aos magistrados e às magistradas que observem as regras e práticas destinadas ao combate ao trabalho infantil, nos procedimentos pertinentes à expedição de alvarás para participação de crianças e adolescentes em ensaios, espetáculos públicos, certames e atividades afins.

Situação
Vigente
Situação STF
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Origem
Presidência
Fonte
DJe/CNJ nº 315/2022, de 19 de dezembro de 2022, p. 2-3.
Alteração
Legislação Correlata
Observação / CUMPRDEC / CONSULTA

SEI n. 00269/2022

 
Texto
Texto Original
Texto Compilado

A PRESIDENTE DO CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA (CNJ), no uso de suas atribuições legais e regimentais,

CONSIDERANDO a proibição do trabalho infantil constante nas Convenções n. 138 e 182 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), ambas ratificadas pelo Brasil e integrantes da lista de convenções que conformam a Declaração de Princípios e Direitos Fundamentais do Trabalho, de 1998, da OIT;

CONSIDERANDO o Princípio n. 9 da Declaração dos Direitos da Criança, adotada pela Assembleia das Nações Unidas de 20 de novembro de 1959, dispõe que “não será permitido à criança empregar-se antes da idade mínima conveniente; de nenhuma forma será levada ou ser-lhe-á permitido empenhar-se em qualquer ocupação ou emprego que lhe prejudique a saúde ou a educação ou que interfira em seu desenvolvimento físico, mental ou moral”;

CONSIDERANDO a Convenção sobre os Direitos da Criança (1989), formalmente incorporada ao ordenamento positivo brasileiro por meio do Decreto n. 99.710/1990;

CONSIDERANDO a vedação ao trabalho infanto-juvenil constante no art. 7º, inciso XXXIII, da CF/88, nos arts. 60 a 69 do ECA e no Capítulo IV, “Da Proteção do Trabalho do Menor”, do Título III da CLT;

CONSIDERANDO os direitos das crianças e dos adolescentes preconizados pelo art. 227 da CF/88;

CONSIDERANDO o Pedido de Providências n. 0005573-63.2011.2.00.0000, advindo do Conselho Nacional de Justiça, no qual figura como requerente o Ministério Público do Trabalho e como requeridas as Corregedorias-Gerais dos Tribunais de Justiça brasileiros, que estabelece que os Corregedores-Gerais dos tribunais sejam provocados a verificar o cumprimento da Constituição da República e das normas de regência no tangente à concessão de autorização para trabalho de crianças e adolescentes;

CONSIDERANDO o teor da decisão do Supremo Tribunal Federal na ADI n. 5.326, em que consta que “ausente controvérsia a envolver relação de trabalho, compete ao Juízo da Infância e da Juventude, inserido no âmbito da Justiça Comum, apreciar, no campo da jurisdição voluntária, pedido de autorização visando a participação de crianças e adolescentes em eventos de caráter artístico”;

CONSIDERANDO os fundamentos apresentados pelo Relator da ADI n. 5.326, em seu voto condutor da decisão do Supremo Tribunal Federal, quanto à autorização prevista no art. 149 do ECA, que trata das condições da representação artística de crianças e adolescentes;

CONSIDERANDO os fundamentos apresentados pelo Relator da ADI n.  2.096, em seu voto condutor da decisão do Supremo Tribunal Federal, em que consta que “o direito à profissionalização [...] pressupõe que a atividade laboral mostre-se compatível com o estágio de desenvolvimento do adolescente, tornando-se um fator coadjuvante no processo individual de descoberta de suas potencialidades e de conquista de sua autonomia, devendo ser realizada em ambiente de trabalho adequado, que o mantenha a salvo de toda forma de negligência, de violência, de crueldade e de exploração”;

CONSIDERANDO o teor do art. 149 do ECA, referente à expedição de portarias e alvarás judiciais afetos à participação de crianças ou adolescentes em espetáculos públicos, ensaios e certames;

CONSIDERANDO que não há previsão da exigência de autorização ou alvará judicial na legislação ordinária que instituiu o contrato de aprendizagem (Lei n. 10.097/2000), o contrato de estágio (Lei n. 11.788/2008), o trabalho socioeducativo (ECA, art. 68) e a atividade desportiva formadora dos atletas mirins (Lei n. 9.615/1998, art. 29, § 4º); 

CONSIDERANDO que a legislação ordinária afeta aos contratos de aprendizagem (Lei n. 10.097/2000), de estágio (Lei n. 11.788/2008), de trabalho socioeducativo (ECA, art. 68) e de atividade desportiva formadora dos atletas mirins (Lei n. 9.615/98, art. 29, § 4º) não condiciona a celebração de tais modalidades contratuais à prévia apreciação judicial;

CONSIDERANDO a necessidade de emprestar efetividade aos objetivos de desenvolvimento sustentável previstos na Agenda 2030 da ONU, o que abrange a “eliminação das piores formas de trabalho infantil” (item "8.7");

 

RESOLVE:

 

Art. 1º Recomendar aos magistrados e às magistradas que, na apreciação de pedidos para a participação de crianças e adolescentes em espetáculos públicos, ensaios e certames, previstos no art. 149 do ECA, atentem para a prévia e imprescindível concordância da criança ou do(a) adolescente e para a autorização e o acompanhamento permanente dos pais e/ou responsáveis, inclusive com a efetiva verificação da compatibilidade entre o tempo de ensaio, os intervalos e as pausas com a regular frequência escolar, além da cautela de resguardar, sempre, o exercício regular da fiscalização administrativa pelos órgãos competentes.

§ 1º Sempre que o magistrado ou a magistrada averiguar a existência de interesse econômico subjacente à atividade artística da criança e do adolescente, deverá oficiar aos órgãos de fiscalização competentes, como Ministério do Trabalho, Ministério Público do Trabalho, Ministério Público Estadual, Conselho Tutelar, Secretaria de Educação ou assistência social, entre outros.

§ 2º Sempre que se constatar que a atividade de crianças e adolescentes abrange tratamento de dados pessoais, deverá o magistrado ou a magistrada zelar pelo cumprimento integral dos comandos constantes no art. 14 da Lei n. 13.709/2018 (Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais – LGPD).

§ 3º A anuência da criança em participar de espetáculos públicos, ensaios e certames deverá ser aferida diretamente pela autoridade judiciária ou por respectiva equipe técnica, observada a especificidade de sua idade, maturidade, bem como as diferentes formas de expressão infantil.

§ 4º A participação da criança de que trata o § 3º deste artigo está condicionada ao acompanhamento de pelo menos um dos responsáveis legais.

§ 5º Expedido o alvará ou indeferido o pedido de autorização de trabalho, o magistrado ou a magistrada oficiará aos órgãos previstos no § 1º deste artigo.

Art. 2º A celebração de contratos de aprendizagem (Lei n. 10.097/2000), de estágio (Lei n. 11.788/2008), de trabalho socioeducativo (ECA, art. 68) e de contratos de atividade desportiva formadora de atletas mirins (Lei n. 9.615/98, art. 29, § 4º) independe de autorização judicial prévia e deve se manter nos limites previstos expressamente na legislação correlata.

§ 1º Os contratos firmados nas hipóteses previstas no caput estão sujeitos à apreciação da autoridade jurisdicional competente, por provocação das partes legitimadas.

§ 2º Na hipótese prevista no § 1º deste artigo, sempre que o magistrado ou a magistrada averiguar violação a direitos de crianças e adolescentes deverá oficiar aos órgãos de fiscalização previstos no § 1º do art. 1º.

§ 3º As ações que tenham como objeto a cessação de qualquer espécie de exploração ilegal de trabalho infantil, bem como as que versem sobre as responsabilizações trabalhista, cível, administrativa ou criminal relativas a tal ilícito deverão contar com tramitação prioritária.

Art. 3º Esta Recomendação entra em vigor na data de sua publicação.

 

Ministra ROSA WEBER