Recomenda aos Tribunais e aos(às) Magistrados(as) a adoção de medidas junto ao Poder Executivo dos Estados e do Distrito Federal para fomentar a inclusão de previsão orçamentária destinada à implementação da Política Nacional de Alternativas Penais e da Política de Atenção às Pessoas Egressas do Sistema Prisional em seus instrumentos de planejamento e orçamento.
SEI n. 00040/2023.
A PRESIDENTE DO CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA (CNJ), no uso de suas atribuições legais e regimentais;
CONSIDERANDO que o Supremo Tribunal Federal reconheceu na ADPF 347 MC que o quadro de violação massiva e persistente de direitos fundamentais no sistema carcerário brasileiro, decorrente de falhas estruturais e da falência de políticas públicas, caracteriza um estado de coisas inconstitucional, cuja superação demanda a atuação concertada de todos os Poderes e instituições públicas para a adoção de medidas abrangentes de natureza normativa, administrativa e orçamentária;
CONSIDERANDO ser a prisão medida extrema que se aplica somente nos casos expressos em lei e quando não cabível nenhuma das alternativas penais, conforme previsto na Constituição Federal (art. 5º, LXV, LXVI) e nos tratados internacionais sobre direitos humanos dos quais o país é signatário (art. 5º, § 2º), como as Regras Mínimas Padrão das Nações Unidas para a Elaboração de Medidas Não Privativas de Liberdade (Regras de Tóquio);
CONSIDERANDO a Carta de intenções assinada entre o CNJ e a Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), com o propósito de promover ações de capacitação e o desenvolvimento do Poder Judiciário nacional no campo dos direitos humanos;
CONSIDERANDO que, desde a Lei n. 6.416/1977, a legislação brasileira evoluiu para inserir mecanismos alternativos de responsabilização criminal, como a suspensão condicional da pena, as penas restritivas de direitos, a conciliação, a transação penal e a suspensão condicional do processo e, mais recentemente, o detalhado rol de medidas cautelares diversas da prisão da Lei n. 12.403/2011;
CONSIDERANDO os estudos científicos que demonstram o uso sistemático, abusivo e desproporcional da prisão provisória no país, em casos de pessoas que ao final do processo são absolvidas ou têm penas alternativas aplicadas, a exemplo de levantamento do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA) publicado em 2015;
CONSIDERANDO o que dispõem a Resolução CNJ n. 213/2015 e os Acordos de Cooperação n. 05, n. 06 e n. 07, de 9 de abril de 2015, firmados entre o Conselho Nacional de Justiça e o Ministério da Justiça e Segurança Pública (MJSP), no sentido de que as medidas cautelares diversas da prisão aplicadas no âmbito das audiências de custódia serão encaminhadas para acompanhamento em serviços instituídos preferencialmente no âmbito do Poder Executivo estadual, denominados Centrais Integradas de Alternativas Penais ou com outra nomenclatura, bem como às Centrais de Monitoração Eletrônica, em casos específicos, cabendo ao MJSP, em parceria com o CNJ, elaborar manuais de gestão dessas práticas, com indicação das metodologias de acompanhamento dessas medidas;
CONSIDERANDO a Resolução CNJ n. 288/2019, que define a política institucional do Poder Judiciário para a promoção da aplicação de alternativas penais, com enfoque restaurativo, em substituição à privação de liberdade, e estabelece que sejam firmados meios de cooperação com o Poder Executivo para a estruturação de serviços de acompanhamento das alternativas penais;
CONSIDERANDO o papel da Política de Atenção às Pessoas Egressas do Sistema Prisional no enfrentamento do estado de coisas inconstitucional do sistema prisional brasileiro, para que a pessoa egressa e seus familiares tenham apoio estatal, da sociedade civil e do setor privado, a fim de garantir seu acesso às políticas públicas, ao trabalho, à educação e a outros serviços públicos, em especial educação, qualificação profissional e oferta de trabalho, como forma de reduzir as vulnerabilidades e inibir novas infrações penais;
CONSIDERANDO a iniciativa do CNJ, no contexto do fomento da Política de Atenção à Pessoa Egressa, para a implantação nacional dos Escritórios Sociais, estruturados em articulação entre os Poderes Judiciário e Executivo locais, que reúnem em um único equipamento público o referenciamento para todas as políticas relacionadas à ressocialização do egresso, com atendimento sistematizado para redução dos fatores de vulnerabilidade;
CONSIDERANDO que o Escritório Social deve ser implementado com a participação das Redes Sociais, constituída por todos os órgãos do Poder Judiciário, pelo órgão gestor da Administração Penitenciária Estadual, Secretarias Estaduais ou Municipais responsáveis por políticas de Assistência Social, Saúde, Trabalho, Habitação, Educação, Cultura, Direitos Humanos, Igualdade Racial, Políticas para Mulheres, e pelas entidades públicas e privadas, inclusive Patronatos, Conselhos da Comunidade, Conselho Penitenciário, Federações empresariais, universidades e instituições de ensino fundamental, médio e técnico-profissionalizantes, bem como outras organizações da sociedade civil;
CONSIDERANDO a necessidade de estabelecer medidas efetivas para implementação da Política Nacional de Alternativas Penais e da Política de Atenção às Pessoas Egressas do Sistema Prisional, mediante a previsão de dotação orçamentária e cargos públicos que viabilizem a estruturação e consolidação dessas políticas;
CONSIDERANDO a necessidade de que as diretrizes, os objetivos e as metas da Administração Pública para despesas relativas à Política Nacional de Alternativas Penais e à Política de Atenção às Pessoas Egressas do Sistema Prisional estejam alinhadas entre si, tendo em vista as regras da Constituição Federal de 1988 para o planejamento e a execução orçamentárias;
CONSIDERANDO a iminência da elaboração do Plano Plurianual (PPA) 2024 – 2027 que determinará as diretrizes, os objetivos e as metas da Administração Pública para despesas de capital e outras delas decorrentes e para as relativas aos programas de duração continuada para os próximos quatro anos;
CONSIDERANDO o deliberado pelo Plenário do CNJ no procedimento Ato Normativo n. 0004320-20.2023.2.00.0000, na 11ª Sessão Virtual, finalizada em 18 de agosto de 2023;
RESOLVE:
Art. 1º Recomendar aos Tribunais e aos(às) magistrados(as) a adoção de medidas junto ao Poder Executivo dos Estados e do Distrito Federal para fomentar previsões orçamentárias destinadas à implementação da Política Nacional de Alternativas Penais e da Política de Atenção às Pessoas Egressas do Sistema Prisional em seus instrumentos de planejamento e orçamento (Plano Plurianual – PPA, Lei de Diretrizes Orçamentárias – LDO e Lei Orçamentária Anual – LOA).
§ 1º A previsão orçamentária de que trata o caput preferencialmente corresponderá a rubricas próprias, com recursos anuais para execução dessas políticas, conforme os parâmetros nacionais.
§ 2º Sempre que possível, os Tribunais de Justiça e os(as) magistrados(as) devem reforçar, junto à sociedade civil e às demais instituições públicas, a necessidade e a oportunidade da programação de ações e da efetivação dos serviços públicos relativos às alternativas penais e às políticas de egressos, como boas práticas para a racionalização do sistema penal e garantia da justiça e da segurança pública em seus respectivos Estados.
Art. 2º Com o objetivo de viabilizar a implementação da Política Nacional de Alternativas Penais e da Política de Atenção às Pessoas Egressas do Sistema Prisional, será estimulada a previsão de dotações orçamentárias aptas aos seguintes objetivos:
I – implementação ou criação de novos núcleos de Centrais Integradas de Alternativas Penais e do Serviço de Atendimento à Pessoa Custodiada, atentando-se para a necessidade de interiorização dos serviços de alternativas penais;
II – contratação de equipe multidisciplinar para compor as Centrais e outros serviços, a exemplo dos Escritórios Sociais;
III – execução de convênios ou tratativas afins para proporcionar e execução de grupos reflexivos e adoção de metodologias restaurativas;
IV – estruturação ou criação de espaços físicos para funcionamento dos equipamentos de alternativas penais ou de apoio aos egressos do sistema prisional; e
V – outras ações destinadas à promoção da aplicação de alternativas penais, com enfoque restaurativo, em substituição à privação de liberdade.
Art. 3º Os Tribunais, particularmente por meio dos GMFs, envidarão esforços junto às secretarias de estado com atribuição para a gestão penitenciária e socioeducativas para criação de grupo de trabalho interinstitucional destinado ao acompanhamento do planejamento e da execução orçamentária relativamente à Política Nacional de Alternativas Penais e à Política de Atenção às Pessoas Egressas do Sistema Prisional, preferencialmente com a participação de representantes do Ministério Público, da Defensoria Pública, da Ordem dos Advogados do Brasil, conselhos e serviços públicos pertinentes e de associações de familiares de pessoas presas.
Art. 4º Esta Recomendação entra em vigor na data de sua publicação.
Ministra ROSA WEBER