Altera a Resolução CNJ n. 106/2010, dispondo sobre ação afirmativa de gênero, para acesso das magistradas aos tribunais de 2º grau.
Convenção sobre a Eliminação de todas as Formas de Discriminações contra as Mulheres (CEDAW)
Convenção Internacional sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação Racial
Declaração e Plataforma de Pequim da Organização das Nações Unidas
Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODSs) da Agenda 2030
Cumprdec n. 0001813-52.2024.2.00.0000
A PRESIDENTE DO CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA, no uso de suas atribuições legais e regimentais,
CONSIDERANDO a garantia constitucional da igualdade em direitos e obrigações entre homens e mulheres (art. 5º, I da Constituição Federal);
CONSIDERANDO o objetivo fundamental da República Federativa do Brasil de promoção do bem de todos(as), sem preconceitos de origem, raça, sexo, gênero, etnia, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação (art. 3º, IV, da Constituição Federal);
CONSIDERANDO que a igualdade de gênero constitui expressão da cidadania e dignidade humana, princípios fundamentais da República Federativa do Brasil e valores do Estado Democrático de Direito;
CONSIDERANDO que a igualdade é um pressuposto fundamental da democracia e que a sociedade democrática jamais poderá ignorar as capacidades, os saberes, a experiência e a criatividade das mulheres;
CONSIDERANDO o disposto no art. 4º da Convenção sobre a Eliminação de todas as Formas de Discriminações contra as Mulheres (CEDAW) de 1979, segundo o qual, a adoção pelos Estados-Partes de medidas especiais de caráter temporário destinadas a acelerar a igualdade de fato entre o homem e a mulher não se considerará discriminação na forma definida naquela Convenção;
CONSIDERANDO o disposto na Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher (“Convenção Belém do Pará”) de 1994 e na Declaração e Plataforma de Pequim da Organização das Nações Unidas de 1995;
CONSIDERANDO que as desigualdades existentes entre homens e mulheres no mundo dos fatos são resultados de construções sociais, estereótipos de gênero e de papéis sociais diferenciados que há séculos sobrecarregam as mulheres e as impedem de exercer sua plena cidadania,
CONSIDERANDO o disposto na Convenção Internacional sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação Racial de 1966 e na Convenção Interamericana contra o Racismo, a Discriminação Racial e Formas Correlatas de Intolerância de 2013;
CONSIDERANDO que as desigualdades de raça, cor e etnia decorrem da discriminação estrutural que permeia a sociedade brasileira, marcada por cerca de 388 de escravidão de pessoas negras e uma abolição inconclusa até os dias atuais, em face dos índices econômicos e sociais apresentados pela população negra, em especial pelas mulheres negras, as quais apresentam especiais dificuldades de acesso a direitos;
CONSIDERANDO que tal estado de coisas configura discriminação e violência de gênero em interseccionalidade com a raça, cor e etnia, as quais devem ser tratadas e superadas pelo direito, em especial pelas ferramentas previstas pelo direito da antidiscriminação;
CONSIDERANDO que, de acordo com levantamento realizado em 2023 pelo CNJ, as mulheres, embora constituam cerca de 51% da população brasileira, representam somente 38% da magistratura, sendo 40% no 1º grau de jurisdição e 21,2% no 2º grau, sem a possibilidade de se estabelecer uma tendência de crescimento de tais percentuais à luz das séries históricas aferidas;
CONSIDERANDO que, conforme levantamento realizado em 2021 pelo CNJ, no universo de todas as magistradas brasileiras, as mulheres negras representam somente 19%, sendo 13,4% das juízas e 12,1% das desembargadoras, não obstante as pretas e pardas totalizem 56% da população feminina brasileira;
CONSIDERANDO a aprovação da Meta 9 pelo CNJ, que consiste em “integrar a Agenda 2030 ao Poder Judiciário”, e que, dentre os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODSs) da Agenda 2030, consta o de número 5, referente à igualdade gênero, desdobrado no objetivo 5.1, para “garantir a participação plena e efetiva das mulheres e a igualdade de oportunidades para a liderança em todos os níveis de tomada de decisão na vida política, econômica e pública”;
CONSIDERANDO que a Comissão Europeia de Eficiência da Justiça aprovou em dezembro de 2022 10 diretrizes para igualdade de gênero no recrutamento e promoção de juízes, indicando a adoção, pelos tribunais, de políticas de gênero enquanto persistir as desigualdades;
CONSIDERANDO que o processo de promoção de magistrados(as) deve ser objetivo e transparente, baseado em dados atualizados acerca do avanço da representação de gênero entre os magistrados e magistradas;
CONSIDERANDO o teor das Cartas de Brasília, alusivas à 1ª e 2ª edições do Seminário Mulheres na Justiça: novos rumos da Resolução CNJ n. 255, realizados pelo Conselho Nacional de Justiça nos anos de 2022 e 2023;
CONSIDERANDO o deliberado pelo Plenário do CNJ no julgamento do Ato n. 0005605-48.2023.2.00.0000, na 2ª Sessão Extraordinária, realizada em 26 de setembro de 2023;
RESOLVE:
Art. 1º. O art. 1º da Resolução CNJ n. 106/2010 passa a vigorar acrescido do art. 1º-A:
“Art. 1º-A No acesso aos tribunais de 2º grau que não alcançaram, no tangente aos cargos destinados a pessoas oriundas da carreira da magistratura, a proporção de 40% a 60% por gênero, as vagas pelo critério de merecimento serão preenchidas por intermédio de editais abertos de forma alternada para o recebimento de inscrições mistas, para homens e mulheres, ou exclusivas de mulheres, observadas as políticas de cotas instituídas por este Conselho, até o atingimento de paridade de gênero no respectivo tribunal.
§ 1º Para fins de preenchimento das vagas relativas à promoção pelo critério de merecimento, os quintos sucessivos a que alude o art. 3º, § 1º, aplicam-se a ambas as modalidades de edital de inscrição (misto ou exclusivo de mulheres) e devem ser aferidos a partir da lista de antiguidade, com a observância da política de cotas deste Conselho.
§ 2º Para fins de aplicação do art. 93, II, a, da Constituição Federal, a consecutividade de indicação nas listas tríplices deve ser computada separadamente, conforme a modalidade de edital aberto (exclusivo ou misto), salvo a hipótese de magistrada que tenha figurado em lista mista, considerando-se consecutiva a indicação de: a) magistrado ou magistrada que figurou em duas listas seguidas decorrentes de editais com inscrições mistas, independentemente do edital de inscrição exclusiva de mulheres que tenha sido realizado entre eles; b) magistrada que figurou em duas listas seguidas, decorrentes de editais com inscrições exclusivas de mulheres, independentemente do edital de inscrição misto que tenha sido realizado entre eles; c) magistrada que figurou em duas listas seguidas decorrentes, uma de edital de inscrição exclusiva para mulheres e outra de edital de inscrição mista, ou vice-versa.
§ 3º Ficam resguardados os direitos dos magistrados e das magistradas remanescentes de lista para promoção por merecimento, observados os critérios estabelecidos nesta Resolução quanto à formação de listas tríplices consecutivas.
§ 4º Para a aferição dos resultados, o CNJ deverá manter banco de dados atualizado sobre a composição dos tribunais, desagregado por gênero e cargo, especificando os acessos ao 2º grau de acordo com a modalidade de editais abertos.
§ 5º As disposições deste artigo não se aplicam às Justiças Eleitoral e Militar. “ (NR)
Art. 2º Esta Resolução entra em vigor em 1º de janeiro de 2024 e aplica-se às vagas abertas após essa data.
Ministra ROSA WEBER