Determina aos tribunais e magistrados(as) o dever de zelar pelo combate a qualquer forma de discriminação à orientação sexual e à identidade de gênero, ficando vedadas, nos processos de habilitação de pretendentes e nos de adoção de crianças e adolescentes, guarda e tutela, manifestações contrárias aos pedidos pelo fundamento de se tratar de casal ou família monoparental, homoafetivo ou transgênero, e dá outras providências.
Cumprdec n. 0007827-86.2023.2.00.0000.
O PRESIDENTE DO CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA (CNJ), no uso de suas atribuições legais e regimentais,
CONSIDERANDO a necessidade de que o processo de adoção seja conduzido em conformidade com as disposições legais pertinentes, a fim de garantir o direito de crianças e adolescentes à convivência familiar e comunitária, em uma sociedade plural, isenta de discriminação relativa à orientação sexual ou de gênero;
CONSIDERANDO que, de acordo com o Supremo Tribunal Federal, no julgamento da ADPF nº 132/RJ e da ADI nº 4.277/DF, o conceito de entidade familiar abrange tanto as famílias monoparentais quanto os casais homoafetivos, destacando-se a necessidade de tratar todas as famílias de forma igualitária, sem qualquer forma de discriminação com base na orientação sexual dos postulantes à adoção;
CONSIDERANDO as decisões do Supremo Tribunal Federal na ADI nº 4.275 e no RE nº 670.422, reconhecendo que o direito à igualdade sem discriminações abrange a identidade ou expressão de gênero, bem como no MI nº 4.733 e na ADO nº 26, que criminaliza as condutas homotransfóbicas;
CONSIDERANDO as decisões da Corte Interamericana de Direitos Humanos, que reconhecem a orientação sexual e a identidade de gênero como categorias protegidas pela Convenção Americana de Direitos Humanos;
CONSIDERANDO as conclusões da pesquisa e o teor do parecer elaborado e aprovado pelo Fórum da Infância e da Juventude do Conselho Nacional de Justiça (Foninj), que concluiu pela necessidade de que sejam realizados ajustes nos procedimentos de habilitação e nos processos de adoção de crianças e adolescentes pelos tribunais e pelos(as) magistrados(as);
CONSIDERANDO a necessidade de eliminar qualquer forma de discriminação e garantir que o processo de adoção seja conduzido com observância do interesse superior das crianças e dos adolescentes, levando em consideração a idoneidade e a capacidade dos postulantes para exercer a função parental;
CONSIDERANDO que a adoção realizada de forma inclusiva, igualitária e respeitosa contribui para a proteção dos direitos fundamentais de crianças e adolescentes, das pessoas que pretendem formar suas respectivas famílias, promovendo a construção de uma sociedade mais justa e solidária;
CONSIDERANDO o compromisso do CNJ quanto à importância de se promover uma cultura de respeito à diversidade e de garantia dos direitos humanos no âmbito do processo de adoção;
CONSIDERANDO a responsabilidade do Poder Judiciário em combater a discriminação e assegurar a igualdade de direitos a todas as pessoas, independentemente de sua orientação sexual, identidade de gênero ou da composição familiar;
CONSIDERANDO a necessidade de adoção de providências que assegurem o aprimoramento institucional do processo de adoção;
CONSIDERANDO a deliberação do Plenário deste Conselho nos autos Ato Normativo nº 0007383-53.2023.2.00.0000, na 17ª Sessão Ordinária, em 14 de novembro de 2023,
RESOLVE:
Art. 1º Os tribunais e magistrados(as) devem zelar pela igualdade de direitos e pelo combate a qualquer forma de discriminação à orientação sexual e à identidade de gênero, ficando vedadas, nos processos de habilitação de pretendentes e nos de adoção de crianças e adolescentes, guarda e tutela, manifestações contrárias aos pedidos pelo fundamento exclusivo de se tratar de casal ou família monoparental, homoafetivo ou transgênero.
Art. 2º Os Tribunais de Justiça devem elaborar cursos estaduais preparatórios à adoção, com caráter interdisciplinar, que contemple a possibilidade de adoção homoparental, bem como explicite as garantias processuais, particularmente de direito a assistente técnico, de assistência jurídica, de manifestação pelos pretendentes sobre os laudos ou pareceres técnicos antes da decisão judicial e da possibilidade de recurso em caso de indeferimento do pedido.
§ 1º Nos Estados em que haja cursos estaduais, os(as) magistrados(as) devem, pessoalmente e assessorados pelas equipes técnicas do juízo, organizar ao menos um encontro local para solucionarem dúvidas e prestar esclarecimentos sobre peculiaridades locais.
§ 2º Nos Estados em que os cursos sejam ministrados pelas Varas da Infância e da Juventude, os(as) magistrados(as) devem participar de ao menos um encontro com os pretendentes visando esclarecimento de dúvidas, bem como assegurar-se de que a possibilidade de adoção homoparental é apresentada aos pretendentes e que todos sejam informados das garantias processuais no processo de habilitação à adoção.
§ 3º Os tribunais e varas da infância e da juventude podem, sempre que necessário e possível, contar com a colaboração de grupos de apoio à adoção com enfoque na adoção homoparental para tratar de assuntos específicos ao público LGBTQIAPN+.
Art. 3º Os Tribunais de Justiça devem prover formação continuada a magistrados(as) e equipes sobre adoção com perspectiva de gênero e particularmente adoção homoparental.
Art. 4º Os(as) magistrados(as) devem analisar nas inspeções aos serviços de acolhimento, institucional e familiar, a efetiva qualificação dos responsáveis para preparar as crianças e adolescentes para adoção em qualquer modalidade de família, inclusive homo ou transafetiva, comunicando ao Conselho Municipal de Direitos da Criança e do Adolescente em caso negativo, nos termos do art. 90, § 3º, II, do Estatuto da Criança e do Adolescente.
Art. 5º Os tribunais deverão incluir nas atividades de incentivo à adoção a inclusão de famílias homo e transafetivas, bem como disseminar os canais da ouvidoria para reclamações em caso de situações de discriminação.
Art. 6º Esta Resolução entra em vigor na data da sua publicação.
Ministro Luís Roberto Barroso