Identificação
Resolução Nº 654 de 04/11/2025
Apelido
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Temas
Ementa

Dispõe sobre o processo de vitaliciamento dos magistrados de 1º grau.

Situação
Vigente
Situação STF
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Origem
Presidência
Fonte
DJe/CNJ n. 248/2025, de 7 de novembro de 2025, p. 9-12.
Alteração
Legislação Correlata
Observação / CUMPRDEC / CONSULTA

SEI n. 00139/2025

 
Texto
Texto Original
Texto Compilado

O PRESIDENTE DO CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA (CNJ), usando de suas atribuições legais e regimentais,

CONSIDERANDO que a vitaliciedade no primeiro grau de jurisdição será adquirida após 2 (dois) anos de exercício da magistratura, conforme disposto no art. 95, inciso I, da Constituição Federal, e no art. 22, inciso II, da Lei Orgânica da Magistratura (Loman);

CONSIDERANDO a necessidade de padronizar e unificar as regulamentações existentes acerca do processo de vitaliciamento em todos os ramos do Poder Judiciário, visando a garantir maior segurança jurídica e avaliação por critérios objetivos, como já ocorre na Resolução CNJ nº 106/2010;

CONSIDERANDO que a participação em cursos oficiais ou reconhecidos pelas Escolas Nacionais constitui etapa obrigatória no processo de vitaliciamento, conforme previsão do art. 93, IV, da Constituição Federal;

CONSIDERANDO que compete ao Conselho Nacional de Justiça (CNJ) o controle da atuação administrativa e financeira do Poder Judiciário e do cumprimento dos deveres funcionais dos magistrados, nos termos do art. 103-B, § 4º, I, da Constituição Federal;

CONSIDERANDO a deliberação do Plenário do CNJ, no Procedimento de Ato Normativo nº 0006818-21.2025.2.00.0000, na 14ª Sessão Ordinária, realizada em 28 de outubro de 2025,

 

RESOLVE:

 

CAPÍTULO I

DAS DISPOSIÇÕES GERAIS

Art. 1º Esta Resolução dispõe sobre o processo de vitaliciamento de magistrados de 1º grau, regulamentando os critérios, a formação, o acompanhamento, a avaliação e a decisão final no período de vitaliciamento de 2 (dois) anos, nos termos do art. 95, inciso I, da Constituição Federal.

Art. 2º O processo de vitaliciamento terá início na data da posse do magistrado e será conduzido pela Corregedoria do Tribunal correspondente, com a colaboração das Escolas Judiciais e dos Magistrados Preceptores.

§ 1º Somente fatos ocorridos durante o período de vitaliciamento poderão ser considerados para fins de avaliação.

§ 2º O prazo para conclusão do processo de vitaliciamento será de 90 (noventa) dias, contados a partir do término dos 2 (dois) anos de exercício, nos termos estabelecidos no caput.

§ 3º Caso o tribunal não conclua o julgamento do vitaliciamento do magistrado dentro do prazo estabelecido no § 2º, deverá informar à Corregedoria Nacional de Justiça as razões do descumprimento, indicando um novo prazo para a conclusão do processo, que não poderá exceder 90 (noventa) dias.

§ 4º Após a conclusão do procedimento de vitaliciamento, o tribunal deverá enviar à Corregedoria Nacional de Justiça uma cópia do processo finalizado. Caso não ocorra a conclusão do procedimento no prazo regulamentar, o processo poderá ser avocado pela Corregedoria Nacional de Justiça para análise.

§ 5º Em qualquer hipótese, a decisão terá efeitos retroativos à data em que o magistrado houver completado os 2 (dois) anos referidos no caput.

 

CAPÍTULO II

DO ACOMPANHAMENTO DO PROCESSO DE VITALICIAMENTO E DOS CRITÉRIOS DE AVALIAÇÃO

Art. 3º O processo de vitaliciamento será conduzido pela Corregedoria do Tribunal e acompanhado pelas seguintes instâncias colaborativas:

I – Escola Judicial do Tribunal;

II – Magistrados Preceptores.

§ 1º Para fins desta Resolução, entende-se por Magistrado Preceptor aquele que acompanha o magistrado em vitaliciamento no exercício de suas funções, distinguindo-se do Magistrado Formador, que é aquele que atua nos cursos de formação como docente.

Art. 4º O magistrado em vitaliciamento será avaliado com base em critérios quantitativos e qualitativos, objetivamente definidos, relacionados aos seguintes aspectos:

I – conhecimento jurídico e capacidade técnica;

II – poder de decisão e adaptação funcional;

III – produtividade e presteza jurisdicional;

IV – conduta funcional e ética;

V – assiduidade e pontualidade;

VI – cooperação e trabalho em equipe;

VII – iniciativa institucional e liderança;

VIII – capacidade de comunicação;

IX – responsabilidade digital e uso de tecnologia;

X – formação e participação institucional.

Parágrafo único. A avaliação não poderá comprometer a independência técnica e funcional do magistrado, considerando o dever de observância à Constituição, às leis e aos precedentes obrigatórios.

Art. 5º Para os fins de avaliação do magistrado em vitaliciamento, serão considerados os seguintes elementos:

I – conhecimento jurídico e capacidade técnica:

a) domínio dos fundamentos teóricos e práticos do direito, capacidade de articulação normativa, jurisprudencial e doutrinária, e atualização permanente;

b) clareza, coerência lógica, estrutura argumentativa, linguagem técnica precisa e fundamentação adequada dos atos decisórios.

II – poder de decisão e adaptação funcional:

a) aptidão para identificar os elementos relevantes do caso concreto, julgar com segurança, ponderar valores e enfrentar situações inéditas ou urgentes;

b) resiliência, equilíbrio emocional, gestão de crises, escuta ativa, sensibilidade institucional e consciência do impacto social das decisões, inclusive na atuação relacionada a minorias, grupos vulneráveis e temas de interesse contramajoritário.

III – produtividade e presteza jurisdicional: volume de atos jurisdicionais prolatados, regularidade na atuação, respeito aos prazos e uso eficiente de recursos de gestão processual.

IV – conduta funcional e ética: independência, imparcialidade, cortesia, transparência, segredo profissional, prudência, diligência, dedicação, integridade profissional e pessoal, dignidade, honra e decoro.

V – assiduidade e pontualidade: presença regular, pontualidade, zelo com os deveres do cargo, dedicação à jurisdição e cumprimento de tarefas administrativas.

VI – cooperação e trabalho em equipe: disposição para atuar de forma integrada e cooperativa com magistrados, servidores e demais atores do sistema de justiça, inclusive em ações formativas.

VII – iniciativa institucional e liderança: proatividade, capacidade de mobilização, incentivo ao aperfeiçoamento institucional e promoção de boas práticas de gestão.

VIII – capacidade de comunicação: urbanidade, objetividade e adequação da expressão oral e escrita, inclusive no trato com magistrados, servidores, advogados, partes e público em geral, bem como postura compatível com a função.

IX – responsabilidade digital e uso de tecnologia:

a) uso adequado de ferramentas digitais, incluindo inteligência artificial;

b) conduta ética em ambientes digitais e redes sociais, observando os parâmetros de institucionalidade e discrição.

X – formação e participação institucional:

a) frequência, aproveitamento e engajamento em cursos e atividades de formação inicial e continuada;

b) contribuição para atividades institucionais promovidas pela Escola Judicial ou outros órgãos do tribunal.

Parágrafo único. Para assegurar a dimensão educacional e formativa do processo de vitaliciamento:

a) caberá às Escolas Judiciais fornecer relatórios de aproveitamento e frequência nos cursos de formação inicial e de formação continuada, consideradas as regras estabelecidas em normativo próprio das Escolas Nacionais de Formação.

b) caberá às Corregedorias dos Tribunais, com a colaboração das Escolas Judiciais, e dos Magistrados Preceptores, a avaliação dos critérios dispostos nesta Resolução.

Art. 6º Os tribunais deverão regulamentar os instrumentos e métodos de avaliação previstos nesta Resolução, definindo os procedimentos de aplicação e valoração com base nos critérios e nos elementos estabelecidos, de modo a assegurar isonomia, coerência interna e integridade.

Parágrafo único. A regulamentação deverá assegurar a aferição padronizada e transparente do desempenho individual, por meio de notas, escalas ou outras métricas, respeitadas as especificidades de cada tribunal, as peculiaridades regionais e a compatibilidade com esta Resolução.

 

CAPÍTULO III

DA FORMAÇÃO INICIAL E CONTINUADA

Art. 7º O Curso de Formação Inicial terá carga mínima de 480 (quatrocentos e oitenta) horas-aula, a ser realizada em até 4 (quatro) meses, com metodologia ativa e avaliação formativa, módulos teóricos e práticos e desenvolvido, preferencialmente, na modalidade presencial, conforme regras estabelecidas em normativo próprio das Escolas Nacionais de Formação.

Art. 8º A formação continuada, para fins de vitaliciamento, abrange, no mínimo, 120 (cento e vinte) horas-aula, além das horas destinadas ao Curso de Formação Inicial, ao longo do biênio.

Parágrafo único. As formações poderão incluir oficinas práticas presenciais com estudos de caso, simulações e técnicas de solução de conflitos.

Art. 9º A participação e o aproveitamento em cursos de formação inicial e continuada, oferecidos pelas Escolas Nacionais ou pelas Escolas Judiciais, são requisitos obrigatórios para conclusão da avaliação do período de vitaliciamento, conforme regulamentado por normativo das referidas instituições de formação.

§ 1º A frequência nas atividades de formação deve ser integral, sendo o controle realizado por instrumentos definidos pelas Escolas Nacionais ou pelas Escolas Judiciais.

§ 2º Eventuais ausências deverão ser formal e fundamentadamente justificadas à direção da respectiva escola, que deliberará sobre a possibilidade de abono da falta ou sobre a necessidade de atividade de reposição a ser realizada obrigatoriamente durante o período do vitaliciamento, nos termos do regulamento das Escolas Nacionais ou das Escolas Judiciais.

§ 3º Excepcionalmente, e mediante decisão fundamentada, o Corregedor poderá prorrogar o período de vitaliciamento para fins de cumprimento da carga horária obrigatória dos cursos de formação, sem prejuízo das atribuições dos diretores das Escolas Nacionais ou Judiciais quanto ao abono de faltas justificadas e à determinação de atividades de reposição.

§ 4º O magistrado que tiver a ausência injustificada aos cursos de formação registrada ou não realizar a atividade complementar de reposição, quando determinada, não preencherá o requisito obrigatório de formação para conclusão do vitaliciamento, na forma estabelecida por regulamento das Escolas Nacionais ou das Escolas Judiciais.

 

CAPÍTULO IV

DAS AVALIAÇÕES PERIÓDICAS DOS MAGISTRADOS

Art. 10. O magistrado em vitaliciamento apresentará à Corregedoria do Tribunal relatórios trimestrais, contendo registros de sentenças, despachos, considerações dos preceptores e demais atos relevantes.

Parágrafo único. Os relatórios conterão registros reflexivos sobre os principais desafios e aprendizados enfrentados, devendo ser elaborados com a supervisão do Magistrado Preceptor, que poderá incluir comentários sobre a evolução funcional.

Art. 11. A Corregedoria do Tribunal e as Escolas Judiciais, com colaboração dos Magistrados Preceptores, avaliarão semestralmente o magistrado em vitaliciamento, por meio de relatórios circunstanciados, podendo originar ajustes nos planos de trabalho e intervenções educacionais e formativas.

§ 1º Para efeito da avaliação de desempenho de que trata o caput, a Corregedoria do Tribunal poderá requerer relatórios ou pareceres psicossociais de forma a abranger aspectos emocionais e comportamentais do magistrado em vitaliciamento, sem prejuízo da avaliação técnica e quantitativa.

§ 2º A Corregedoria do Tribunal poderá requisitar informações adicionais a outros órgãos.

§ 3º O relatório a que se refere o caput será comunicado ao magistrado em vitaliciamento, com indicação dos critérios considerados, das eventuais insuficiências detectadas e das sugestões institucionais voltadas ao aprimoramento de sua atuação funcional.

§ 4º A avaliação terá caráter orientador e progressivo, destinando-se ao acompanhamento sistemático da trajetória evolutiva do magistrado em vitaliciamento, sem prejuízo de ser considerada na decisão final sobre a aquisição da vitaliciedade

§ 5º Em casos excepcionais, a Corregedoria do Tribunal poderá requerer avaliação psicológica ou psiquiátrica do magistrado em vitaliciamento, mediante decisão fundamentada com enunciação das razões que justificam a diligência, identificadas após a posse do magistrado, a ser decidida pelo órgão competente definido na estrutura do respectivo tribunal.

Art. 12. O processo de vitaliciamento será submetido ao órgão competente definido na estrutura do respectivo tribunal, que, por decisão fundamentada em critérios objetivos e técnicos, considerando o conjunto das avaliações da Corregedoria do Tribunal, deliberará sobre a confirmação da vitaliciedade, assegurado o contraditório e a ampla defesa.

Parágrafo único. A decisão será tomada em sessão pública, com votação nominal, aberta e fundamentada, podendo resultar na confirmação da vitaliciedade ou na perda do cargo.

 

CAPÍTULO V

DAS DISPOSIÇÕES FINAIS

Art. 13. O afastamento do magistrado por mais de 90 (noventa) dias durante o período do vitaliciamento, ainda que de forma não contínua, implicará a prorrogação do processo de vitaliciamento por igual período, excetuadas as hipóteses legais de licença-maternidade, paternidade ou adotante que serão consideradas como de efetivo exercício para fins de vitaliciamento.

§ 1º A regra de prorrogação do caput não se aplica à licença para tratamento de saúde, desde que a condição médica não prejudique o exercício substancial da jurisdição.

§ 2º Para outras licenças e afastamentos inferiores a 90 (noventa) dias, mas superiores a 30 (trinta) dias, a Corregedoria do Tribunal poderá, mediante decisão fundamentada, prorrogar o vitaliciamento por igual período.

Art. 14. É vedada a concessão do regime especial de trabalho aos magistrados em vitaliciamento.

§ 1° Em situações excepcionais, devidamente comprovadas por documentação idônea, o regime especial de trabalho poderá ser autorizado pela Corregedoria do Tribunal, de forma temporária e pelo período estritamente necessário, devendo a decisão ser fundamentada.

§ 2° Consideram-se hipóteses excepcionais aquelas previstas pela Resolução CNJ nº 343/2020, ou outra que vier a lhe substituir, e demais situações que dificultem a presença física do magistrado na sua unidade de trabalho.

Art. 15. Deve ser instituída, no âmbito de cada tribunal, a Comissão Permanente de Vitaliciamento, órgão colegiado de apoio à Corregedoria, com a seguinte composição e atribuições:

I – a comissão terá, no mínimo, 3 (três) magistrados vitalícios, designados pela Corregedoria do Tribunal;

II – compete à Comissão Permanente de Vitaliciamento:

a) consolidar os relatórios e as avaliações semestrais dos magistrados em vitaliciamento, com base nas informações fornecidas pela Corregedoria, pelas Escolas Judiciais, pelos Magistrados Preceptores e pelo Magistrado em Vitaliciamento;

b) propor à Corregedoria, de forma fundamentada, diretrizes e medidas para o aprimoramento do processo de vitaliciamento;

c) emitir parecer opinativo, quando solicitado pela corregedoria, sobre casos omissos ou situações excepcionais relacionadas ao vitaliciamento para subsidiar a decisão do corregedor;

d) auxiliar a Corregedoria no acompanhamento das atividades de formação e na análise dos relatórios trimestrais dos magistrados em vitaliciamento.

Parágrafo único. As atividades da Comissão Permanente de Vitaliciamento não afastam a competência da corregedoria para a condução e a supervisão individualizada do processo de vitaliciamento, cabendo ao Corregedor a decisão final sobre as propostas e os pareceres emitidos pela Comissão.

Art. 16. As Escolas Nacionais de Formação poderão editar atos orientativos sobre a formação inicial e continuada e apoiar as Escolas Judiciais dos Tribunais na implementação desta Resolução.

Art. 17. Os tribunais poderão adotar plataformas virtuais, softwares ou sistemas para integração das atividades de acompanhamento, avaliação e formação dos magistrados em vitaliciamento.

Art. 18. Os tribunais e as Escolas Judiciais deverão adaptar seus normativos a esta Resolução no prazo de 120 (cento e vinte) dias.

Art. 19. Esta Resolução entra em vigor na data de sua publicação e se aplica somente aos processos de vitaliciamento iniciados após a sua publicação.

 

Ministro Edson Fachin